D E S C A N S E O S O L H O S OLHANDO PARA ESTA LINDA FLOR
Numa aldeia algures no norte do país
Nasceu em tempos remotos um menino com o nome de Agão, era o único menino na aldeia. Os pais pobrezinhos e doentes, passavam o dia inteirinho a tentar arranjar algo comestível, para o seu rebento, menino que parecia insaciável, sempre de mão esticada pedindo pão! Era a única criança na aldeia e logo foi nascer no lar mais pobre, na caverna mais fria, no ceio de um casal mais doente e miserável!
Não era fácil. A dedicação ao miúdo era de tal modo escassa que se queria carinhos, tinha de os procurar em tudo que lhe aparecia pela frente! Tornou-se perito em observar, precisava-se uma fantasia muito fértil para poder fazer de uma simples rocha, um amigo com quem falar, de uma árvore seca e sem uma única folha uma mãe a quem abraçar! E assim foi abraçando a arvore seca e falando com as rochas que por ali não faltavam. Cresceu entre escassos carinhos maternais, mas com carinhos virtuais. Agora já com 12 aninhos já se sentia homem, já queria tomar a vida pelas próprias mãos, fazer a sua própria caverna e torna-la bem mais confortável que aquela onde vivia. Deitou mãos à obra e com a ajuda dos amigos virtuais foi criando uma muralha em seu redor, crescia de dia para dia e passado algum tempo já tomara formas que nenhum ser humano de então jamais tinha visto! Era sim redondinha, mas não era escavada em nada! Era autónoma e com uma forma que deixava adivinhar ser possível criar em qualquer lugar sem precisarem de condições especiais. Era uma inovação, de tal forma que foi chamando a atenção das criaturas que por ali passavam e ficavam pasmados.
Mas que coisa esquisita e linda ao mesmo tempo, eram os comentários que se ouviam!
O menino entusiasmado e incansável foi trazendo pedrinhas após pedrinhas e amontoando de forma inteligente, aconselhado pelos seus amigos foi pondo pedra sobre pedra até que já quase não conseguia sair lá de dentro! Estava agora perante um problema que até ao memento não lhe tinha passado pela cabeça! Como seria depois de feito?
Será que ainda era possível depois de construído, penetrar nela?
Foi então pedir conselho à sua velha amiga e madrasta! Esta respondeu com sabedoria;
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Meu filho, Agão. Deves de plantar uma árvore bem juntinho à muralha! Ela crescerá e torna-te fácil o acesso, nunca te esqueças de a regar e tratar bem.
Assim fez, procurou uma semente e encontrou algo que lhes veio voando cair a seus pés! Era uma semente de tília. Passado algum tempo após a ter semeado consoante a madrasta lhe tinha aconselhado, eis que nasce um rebento verdinho e lindo. Desenvolvia a olhos vistos e em breve se tornou numa linda arvore. Já a madrasta tinha cedido por completo, alguém passou e a tinha levado, servia agora como vara de apoia ao pai que no entanto já tinha atingido os seus trinta e muitos anos e já quase não se podia deslocar, Envelhecera guardando duas cabras num monte e que eram as únicas fornecedoras de alimento, davam algum leite e este tinha de chegar para as três refeições diárias…faziam-se trocas de alimentos naquela época.
Agão tinha agora já a sua construção praticamente acabada, já estava quase com catorze anos feitos, já se sentia homenzinho.
Construíra uma caverna cilíndrica que aparenta um actual moinho de vento só que sem telhado! Mas a madrasta previa o futuro e com seu poder pôs-lhe em mão a solução, a tília que agora era uma árvore crescida cobria com seus ramos enormes e perfumados toda a superfície da zona superior! Estava agora construída a caverna onde Agão iria passar o resto do seu tempo adulto. Era jovem e ágil, subir até à copa da tília era fácil, difícil seria descer para o interior! Mas isso seria algo para resolver posteriormente. Mal sabia ele que um dia pagaria caro o facto de não ter resolvido logo o problema, andou a magicar como resolver! E encontrou a solução, só que esqueceu de pensar que nem toda a gente é tão ágil como ele! Logo devia ser algo estável e seguro… no entanto estava criado maneira de descer para o interior.
Ao sair de lá passou um pastor que muito admirado, lhe perguntou o que vinha a ser aquilo, ao que ele explicou, isto vai ser a minha caverna, é aqui que quero viver um dia com uma companheira! O pastor ficou abismado com a sabedoria do rapaz! Entendeu muito bem e elogiou todas as explicações que tinha recebido. Agão ganhou ali um amigo.
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Voltou orgulhoso para a caverna dos pais para lhes comunicar que ia procurar uma companheira e criar uma família, os pais já com as mãos trementes o abraçaram e felicitaram pela coragem e valentia, teceram-lhe elogios relatando o que iam ouvindo do povo vizinho em relação à inovadora caverna que construiu. Pena não a ter construído ali bem perto! Seria uma alternativa à caverna húmida onde tinham de dormir noite após noite. Agão explicou a seus pais que tinha sido aconselhado num sonho a fazer uma caverna bem mais para baixo do picoto, tinha tido uma visão que lhe mostrava que no futuro havia de existir uma aldeia bem grande e linda, no sítio onde ele construísse a sua própria caverna! Assim procurou o lugar mais adequado, e que melhores condições proporcionassem! A assim fez
Foram deitar-se e no dia seguinte quando se levantou, estava uma manhã luzente o sol brilhava e fazia já algum calor, estava-se já a meio da Primavera… olhou para o lugar onde estavam deitados seus pais, pareciam um casal em lua-de-mel jaziam deitados e de mãos dadas, mas algo estava errado! As mãos não tremiam, como era já costume observar! Tinham um ar calmo e de felicidade, PAI, MÃE, gritou mas eles já não ouviam! Tinham partido para uma vida nova e calma. Agora era a vez do filho seguir as pisadas… só que o futuro ali não era risonho! Havia um problema que lhe podia ser fatal! Como arranjar uma parceira para constituir família? Tratou primeiro do funeral dos pais, foi depositar os corpos junto a um ribeiro pequeno, lugar onde costumavam se sentar ao fim do dia para descansar à sombra de um choupo enorme, que de tão inclinado que estava a sua folhagem quase parecia saciar a cede nas águas límpidas e frescas numa lagoa formada pela queda de água. Embrulhou ambos os corpos numa manta feita pela mãe, ainda no tempo em que tinha saúde e forças! Não foi tarefa fácil, banhado em lágrimas e com a ajuda de um pastor que muitas vezes levava seu rebanho ali junto do mesmo ribeiro para que pudessem beber. Para de seguida se por a caminho, agora já com 14 anos, era tempo de ir à procura. Deixou as cabras entregues ao pastor que o ajudara e seguiu caminho. Percorreu montes e vales, atravessou o rio Tâmega e foi dar com uma comunidade que juntamente com o gado numa pastagem bem perto das margens, se tinham alojado!D E S C A N S E O S O L H O S OLHANDO PARA ESTA LINDA FLOR
CONTINUAÇÃO
Moravam debaixo de umas árvores enormes que davam sombra e abrigo, do sol abrasador, que já se fazia sentir. Convidaram-no para se juntar a eles, podia refrescar-se comendo algo e bebendo uma malga de leite fresquinho. Sentou-se então junto dos vários homens, que com ar de gente feliz, por ali descansavam. Enquanto que algumas mulheres tratavam de manter o gado junto e à sombra, tratavam muito bem todo o gado, sabiam que eram a fonte de riqueza que lhes restava. Deu então de caras com uma mocinha que não devia ter mais de 14 anos, cabelos muito longos, olhos escuros e uma vestimenta que sendo de gente pobre, lhe dava um ar feminino muito giro, tinha umas alças que deixava levemente ver os ombros morenos mas fortes, já deixava adivinhar um peito muito bem formado, embora ainda não muito grande. Parecia um pouco tímida, tinha um ar envergonhado, mas ao mesmo tempo um leve sorriso se soltou no momento que os olhares se cruzaram, deixou o Agão corar! Sentia-se um pouco envergonhado, nunca tinha visto uma rapariga tão perto e ainda tão bonita, sentiu-se imediatamente apaixonado. Perguntou a um dos que lá estava sentado, quem ela era e como se chamava. O senhor riu, e depois de balbuciar um pouco, respondeu. Se a quiseres podemos falar. Mas vais ter de mostrar valores que me convençam a deixar que leves a única filha que tenho! Meu caro amigo.
Oh desculpe, não sabia que era a sua filha. Não faz mal, não te assustes! Ela já esta uma mulher e olha a tua volta! Por estas bandas não existem assim tantos homens, aliás és o primeiro rapaz que se cruzou por aqui desde cá chegamos já lá vão uns cinco anos… estava a ver que nunca mais arranjava homem para ela. Agão deu uma olhadela muito disfarçadamente, realmente as pessoas que ali estavam sentadas todos eram já pessoas com idades adiantadas! Pediu licença para se levantar. Não era muito comum, alguém ter o senso de pedir desculpa para se retirar! O velho senhor acenou com ar de consentimento, mas acrescentou, tu deves de ser de uma família rica! Pois até hoje nunca ninguém me pediu desculpa por nada! Quem são os teus pais? Perguntou ele um pouco na expectativa de que a resposta fosse positiva! Queria ouvir dizer que eram donos de terras e de bens…
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Mas a resposta não foi assim tanto satisfatória. Os meus pais já faleceram, estou só neste mundo, eles era pobres e doentes, os bens que tinham eram duas cabras e uma caverna no picoto.-- Onde deixaste as cabras? Perguntou o velho. Ah as cabras! Essas, deixei entregue aos meus amigos. - Amigos? Sim, e lá explicou quem eram e quanto o ajudaram pela vida fora
Vá adiante, não importa, diz o velho balbuciando. Foi só uma pergunta! Ainda bem pois os ricos são antipáticos, nunca se conseguem identificar com nós pobres! E isso dos amigos serem pedras vais ter de explicar melhor um dia… agora vai é lá ter com a Miranda! Falar com ela, acertar tudo e para ver se te serve!
Agão levantou-se e foi ao encontro da sua futura mulher.
Olá Miranda! Olá, respondeu ela com um ar tímido, como te chamas? – Agão, -Agão quê? Somente Agão! Nunca me tinham perguntado tal coisa! Constatou ele.
Está bem, não tens de explicar nada, sabes sou muito curiosa! A conversa animou, as horas passaram e em breve já se conheciam bem melhor, os sorrisos eram agora já mais soltos entre ambos. Quero um dia mostrar-te a minha nova habitação! Nunca viste nada assim! Bem não foi só minha, a ideia. Tive ajuda dos meus amigos, pegou num pau e desenhou a forma de sua caverna futurista, num espaço previamente alisado com plenas mãos. Miranda seguia cada gesto do seu novo amigo e quiçá futuro noivo, sentia que era muito habilidoso, tinha jeito para desenhar, sem que ele se apercebesse foi-lhe tirando as medidas de cima abaixo, pensando para si mesma… mas que belo rapaz! Sentia-se apaixonada por cada movimento que ele fazia, era muito bem parecido e forte, já estava a imaginar como iria ser estar casada com ele. Agão apercebeu-se que estava a ser observado e parou. Que se passa? Fiz alguma coisa de mal? – Não, não está tudo bem! Só estava a ver como sabes desenhar tão bem. Seguiram as conversas e contos de cada um. Descobriu que tinha acertado em cheio na idade dela! O que o deixou muito orgulhoso, tinham a mesma idade.
Num ápice estava tudo falado, nada mais havia para contar. Agora o casamento era o que mais se ajustaria! Pois haviam meninos para trazer ao mundo. Regressaram para junto do acampamento sempre com um sorriso mútuo no canto dos lábios.
Pai, o Agão diz que já falaste com ele! Podemos mesmo casar?
Claro, minha filha, diz o velho. A boda já está a ser preparada! Uma vitela já está prestes a ser abatida, vai haver festa… estava visivelmente contente! O velho dançou de alegria, depressa anunciou que ia haver casamento, e mais depressa quis começar o festim. As forças já não eram assim tantas, a esposa já tinha falecido quando a Miranda estava em vésperas de fazer três anos de idade, deixando a Miranda aos cuidados da irmã que por sua vez também já era viúva. O marido tinha sido abatido numa rixa ainda antes de conceber qualquer filho, ela era a irmã mais nova da Irina, mãe de Miranda. Assim foi ficando sempre aos cuidados do cunhado, consta-se que acabaram envolvidos! Mas nunca se soube muito bem ao certo.
A tia que já era mais mãe que outra coisa, sentiu uma tristeza imensa, foi-se sentar numa rocha bem juntinho à água e chorou a seu belo prazer, murmurou algumas palavras para o vento! Como se estivesse a falar com a irmã, conseguia-se perceber algo como… a tua filha está uma mulher e vai casar, vai-nos abandonar para fazer vida própria! Depois calou-se e limpando as lágrimas com uma das partes do saiote que usava, encostou-se e adormeceu.
De manhã já se ouvia o galo cantar, quando foi acordada pela Miranda, tia, tia acorda, anda ver, o pai vai abater um vitelo! Quer que o ajudes. Nora levantou-se chegou-se junto da agua para lavar as remelas dos olhos e segui a sobrinha sem dizer mais nada, só observava como esta enquanto andava pulava simultaneamente, era de contente. Nora relembrava o dia em que era ela que ia casar e tinha o mesmo jeito de saltitar, era uma maneira de mostrar quanto feliz se sentiam.D E S C A N S E O S O L H O S OLHANDO PARA ESTA LINDA FLOR
Já o vitelo estava pendurado pelas patas de trás numa das árvores e prestes a ficar de barriga aberta, havia algo no ar! Um sentimento de mistura entre felicidade e amargura nos mais velhos, os noivos, esses só sentiam felicidade. Agão foi momentaneamente assaltado por um pensamento que o deixou triste, retirou-se um pouco para um lugar onde não havia ninguém, queria estar a sós! Lembrou-se dos pais e de quanta vontade tinha de partilhar com eles aquele momento, assim soltou-se-lhe uma lágrima, que prontamente foi limpa por uma mão que se tinha aproximado sem que ele tivesse dado por isso, era Miranda, estava preocupada com a retirada repentina do seu amado, já não quer estar nem um segundo longe dele! Agão contou-lhe o que o assaltou momentaneamente e da saudade que sentiu de seus pais, gostaria de ter partilhado aqueles momentos de felicidade e que nunca mais poderia partilhar com eles, assim teria de o fazer em pensamentos. Miranda sentou-se ao lado dele e passando a mão pelo cabelo foi dizendo com palavras mansas que sabia muito bem o que era perder alguém, também perdeu a mãe e ainda hoje sente a falta apesar de já se terem passado tantos anos e da tia ter sido como se de uma mãe se tratasse! Como não tinha tido filhos, muitas vezes manifestou o desejo que eu a tratasse por mãe e nunca fui capaz. Agora já mais recomposto sugeriu que fossem ajudar nas tarefas, não seria justo deixar que fossem somente os adultos a tratar de tudo, quando se tratava de uma festa em prol deles! Ela acenou com a cabeça passando com o indicador docemente sobre o nariz de Agão, que até gostou do gesto e retribuiu com um profundo olhar como que dizendo, amo-te… ela sentiu isso mesmo, foi um momento lindo e profundo, estavam num estado tal de graça que todos os movimentos eram seguidos intensamente como se de algo fundamental para viver se tratasse.
Já se tinha dado falta do casalinho, alguém deixou um desabafo, estilo… esta juventude de agora é cada vez mais desavergonhada! No meu tempo não aconteciam estas coisas, só podíamos namoriscar com a presença de alguém para tomar conta! Mas o pai calou logo as bocas que se levantaram com um comentário muito apropriado; se era preciso alguém tomar conta, é porque não eras de confiança. Calaram-se as vozes, nenhum comentário mais se ouviu e voltou tudo ao trabalho.
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ESTAS FLORES FORAM POR MIM FOTOGRAFADAS NO JARDIM DA MINHA MÃE, EM A BRAGÃO
Autor: Alexandre Ferreira
continua...